Ainda não tinha escrito sobre o meu curso de escrita criativa, mas também não o vou fazer agora, porque não tenho tempo. Mas passei o trabalho de casa para aqui, e se tiverem a paciência de ler este texto e puderem dizer-me se se sentem transportados para uma festa de casamento mexicana, cuja descrição tem de usar todos os sentidos excepto o da visão, agradeço!
Só eu para me meter nestas coisas!!!
Festa de Casamento
O som dos petardos troava, deixando no ar um cheiro acre a pólvora antiga. Enquanto se dirigiam da acolhedora capela, com o seu odor a cera quente e a promessas de futuro risonho, para o recinto da festa, Pepe e Lupe, recém casados, eram bombardeados com pétalas de flores e alguns parcos grãos de arroz, que se alojavam na gola da camisa dele e no decote do vestido dela. De olhos fechados, Lupe sorria, agarrada ao marido, sentindo-lhe a mão forte a prender a sua, ligeiramente húmida de emoção. Tremia, apesar do sol abrasador, cujos raios verticais e impiedosos lhe massacravam os ombros nús. Tremia de impaciência. Desejava que a festa acabasse depressa, que os convivas esvaziassem as malgas de fajitas e os tachos de arroz de milho, que os cânticos se calassem e que as danças terminassem o rodopio dos corpos gordos e suados. Mas Pepe, alegre e falador, parecia tão feliz que ela, conformada, se rendeu à alegria contagiante que os esperava no recinto ao ar livre. Os gritos de ‘felicidades!’ enchiam o ar. Os silvos da carne a grelhar no carvão vivo misturavam-se com as ordens ásperas de Papacito, o pai da noiva. Era ele o encarregado da comida. Com mãos hábeis, trinchava grandes peças de carne suculenta, cujo sumo escorria sobre a bancada, e colocava-as delicadamente sobre a grelha. Juntava depois uns pimentos cor de sangue e outros cor de sol, uma mão cheia de sal e avivava o conjunto regando-o generosamente com a sua tequila caseira. Ao lado da grelha, num pote de terracota áspera, o famoso, e secreto, molho de seiva de cacto. Pastoso, encorpado, inebriante. O odor desmentia a simplicidade da confecção, e os convivas rodeavam Papacito, disfarçando a impaciência com cantigas de louvor aos noivos. A voz das concertinas já roucas misturava-se com o trinar das travessas, que as mulheres iam trazendo da cozinha e depositando em cima das mesas, num restolhar dos folhos dos vestidos tradicionais. Crianças rindo, tentando partir a pinhata presa à árvore seca. Vinho a escorrer da pipa rugosa para infindáveis brindes aos noivos. Rosnados e latidos dos cães, magros, disputando os ossos atirados para o chão. Tiros inebriados, disparados para o ar. E corpos a rodopiar, gordos e suados, esmagando o pó pegajoso do chão, tossindo, mais que cantando, caindo, mais que dançando…
Muitas horas depois do sol já ter descido, e do céu se ter coberto com o seu manto de estrelas, os convivas partem. Pepe beija Lupe na testa e, pegando-lhe na mão trémula, leva-a para a primeira noite do resto das suas vidas.
O som dos petardos troava, deixando no ar um cheiro acre a pólvora antiga. Enquanto se dirigiam da acolhedora capela, com o seu odor a cera quente e a promessas de futuro risonho, para o recinto da festa, Pepe e Lupe, recém casados, eram bombardeados com pétalas de flores e alguns parcos grãos de arroz, que se alojavam na gola da camisa dele e no decote do vestido dela. De olhos fechados, Lupe sorria, agarrada ao marido, sentindo-lhe a mão forte a prender a sua, ligeiramente húmida de emoção. Tremia, apesar do sol abrasador, cujos raios verticais e impiedosos lhe massacravam os ombros nús. Tremia de impaciência. Desejava que a festa acabasse depressa, que os convivas esvaziassem as malgas de fajitas e os tachos de arroz de milho, que os cânticos se calassem e que as danças terminassem o rodopio dos corpos gordos e suados. Mas Pepe, alegre e falador, parecia tão feliz que ela, conformada, se rendeu à alegria contagiante que os esperava no recinto ao ar livre. Os gritos de ‘felicidades!’ enchiam o ar. Os silvos da carne a grelhar no carvão vivo misturavam-se com as ordens ásperas de Papacito, o pai da noiva. Era ele o encarregado da comida. Com mãos hábeis, trinchava grandes peças de carne suculenta, cujo sumo escorria sobre a bancada, e colocava-as delicadamente sobre a grelha. Juntava depois uns pimentos cor de sangue e outros cor de sol, uma mão cheia de sal e avivava o conjunto regando-o generosamente com a sua tequila caseira. Ao lado da grelha, num pote de terracota áspera, o famoso, e secreto, molho de seiva de cacto. Pastoso, encorpado, inebriante. O odor desmentia a simplicidade da confecção, e os convivas rodeavam Papacito, disfarçando a impaciência com cantigas de louvor aos noivos. A voz das concertinas já roucas misturava-se com o trinar das travessas, que as mulheres iam trazendo da cozinha e depositando em cima das mesas, num restolhar dos folhos dos vestidos tradicionais. Crianças rindo, tentando partir a pinhata presa à árvore seca. Vinho a escorrer da pipa rugosa para infindáveis brindes aos noivos. Rosnados e latidos dos cães, magros, disputando os ossos atirados para o chão. Tiros inebriados, disparados para o ar. E corpos a rodopiar, gordos e suados, esmagando o pó pegajoso do chão, tossindo, mais que cantando, caindo, mais que dançando…
Muitas horas depois do sol já ter descido, e do céu se ter coberto com o seu manto de estrelas, os convivas partem. Pepe beija Lupe na testa e, pegando-lhe na mão trémula, leva-a para a primeira noite do resto das suas vidas.
Quase chorei...
ResponderEliminarTou a gozar,mas gostei bastante,acredita!
Estas sempre a surpreender-me...és só talentos!
Beijinhos e bom Carnaval!
Eu gostei da festa mexicana!
ResponderEliminarBeijinhos
Acho que tens boas hipóteses de levar um BOM no T.P.C.. :o)
ResponderEliminarDualidades JP
Olá Safira,
ResponderEliminarQuando puderes passa pelo meu blog, tenho lá uma surpresa para ti!
Beijinhos
Já comia... quando é o almoço?
ResponderEliminarE que bem que saiu o TPC! Estou cada vez mais curiosa por esse curso!!
ResponderEliminarAcho difícil fazer melhor!
ResponderEliminarMas tenho algumas dúvidas sobre o sumo da carne a escorrer na bancada e na côr dos pimentos... :)
Gata Verde: E também cozinho bem, toco piano e falo francês. Na verdade, não percebo como é que é que ainda sou solteira. ha haahaha :)
ResponderEliminarUm grande beijo, e obrigada
Sérgio: já vou ao teu sítio agradecer, que ontem foi tudo um bocado à pressa.
Dualidades: obrigada, JP. Mas pelo que percebi, os trabalhos só são comentados, e não classificados. Ainda bem! :)
Fausto: :), mas se soubesses o que se come no méxico, mudavas depressa de opinião. Garanto-te!
Jasmim: Eu prometo dedicar um post decente ao curso, porque merece. Mas é um bocado o delírio. Só para que percebas o que quero dizer, um dos primeiros exercícios foi descrever o que sente uma aspirina ao cair num copo de água. Mas é muito giro! E, para os mais ou menos tímidos, como eu, é uma forma de enfrentares um público, porque depois temos de ler. MAs é tudo malta porreira, e o monitor é muito comunicativo e põe-te muito à vontade.
Teté: Obrigada, estou um bocadinho corada... mas tenho a certeza que a malta lá do curso se vai sair com umas coisas muito mais à frente. Às vezes fico parva com as frases que ouço. Mas é bom, porque mantém-me humilde, se bem que às vezes também fique frustrada e pense 'ora bolas, como é que eu não me lembrei de seguir este caminho'. Enfim, é preciso é não se levar demasiado a sério, e, enquanto for divertido, é o que interessa. Não espero vir a ser o próximo Hemingway, e ainda bem porque consta que o homem bebia desalmadamente, e acho muito triste andar-se ai aos caídos.
Anyway...só para tentar explicar a história dos pimentos foi: uma tentativa de metaforização para que se percebesse que eram pimentos vermelhos e pimentos amarelos. Aparentemente, não resultou muito bem :)
beijinhos
Já lá estou no México...;-)
ResponderEliminarE eu que tanto queria lá ir...:-)
A sério escreves mto bem de uma maneira geral, e de facto este texto consegue nos trnasportar para outro espaço, outra realidade...
Well done! :-)
Bjs
Gostei do texto! Muito! Até quase que parecia ouvir umas musiquitas mexicanas daquelas que nos fazem mesmo começar a bater com o pezinho!
ResponderEliminarBjs
Nunca comi mexicano. Até que tenho uma certa curiosidade
ResponderEliminarAdorei adorei adorei adorei =)
ResponderEliminartens mesmo inúmeros talentos, moça. Tb não percebo pq é que tás solteira. ;-p tu percebeste o que eu queria dizet ;-)
No inicio não entendi bem o tpc. Pensei que fosse algo como o casamento de dois mexicanos cegos, com convidados cegos. LOOOL!
mas, adorei. honestamente. adoro a tua escrita, acho que és uma artista nata e multifacetada. :)
ResponderEliminarbem giro, esse curso.
que máximo, descrever uma aspirina a mergulhar num copo de água??? glugluglu socooooooooooorooooooo acudaaaaaaaaam-me! LOLOLOL
pena que aqui em baixo não haja nada dessas coisas... =(
Eu mesma: Estive no México faz agora um ano, num circuito pelas ruínas Mayas. Atravessamos três estados, e acho que foi uma das viagens da minha vida. Recomendo vivamente, é maravilhoso! Nunca vi água azul como a Cancún (lado chique, não do lado da lagoa no hotel roskov, onde nos enfiaram, mas pronto, nevermind.)
ResponderEliminarCarracinha: olha, acreditas que foi da musiquita que senti falta? Em termos de animação o programa foi muito fraquinho. Só consegui ouvir dois nativos a tocar o La Bamba num autocarro, mas os pobres não cantavam nada de jeito, era uma barulheira que não se podia! :)
Fausto: Então tu estudas em Lisboa e ainda não foste a uma 'Cantina Mexicana'? Se bem que, no meu tempo, o que estava a dar era um mexicano na D. Carlos I (perto da Assembleia da Répública), mas não sei se ainda existe. Senão, em qualquer um dos Centros Comerciais de LIsboa encontras uma cantina. Dá para ter uma ideia.
A minha experiência é que comi melhor em restaurantes cá do que próprio do México. Caraças, muita fominha passei (tou a falar a sério). Uma vez, o jantar era tão mau que tive de andar a juntar moedas para ir a uma máquina de snacks e tirar o que lá havia. Bolachas de canela, e eu nem sequer sou fã de canela!!!
Vanadis: cada tiro cada melro! ha ha ha, o que eu me ri com os teus mexicanos cegos!!!!
Tens de vir morar para a capital, há montes de coisas para fazer aqui!!! :)
O curso +e mesmo muito giro, estou a adorar. Mas ás vezes sinto-me mesmo burrica. Disso gosto menos, mas pronto, faz parte!
Beijos a todos e obrigada pelas vossas opiniões!!
pois, sou culpado. nunca comi mexicano. quando como fora vou sempre aos sitios mais rapidos e mais baratos, vulgo fast food.
ResponderEliminaracho que me ia dar bem no mexico. eu gosto de bolachas de canela :)