domingo, 27 de fevereiro de 2011

Do flagelo que é o atendimento nos tempos que correm

Tenho para mim que as livrarias deviam adoptar uma nova forma de estar no mercado e partir para um conceito mais automático. Tipo self service, mesmo. Só para evitar que as pessoas sejam atendidas por mentecaptos.
Encomendei um livro na Almedina do Atrium Saldanha. Isto porque me disseram que o tinham em stock. O que omitiram é que o tinham em mau estado. Quando a jovem grunge/gótica aparece com o título, depois de perguntar três vezes o meu nome e se tinha encomendado por mail ou por telefone, como se isso fosse uma coisa extremamente relevante, vejo que o livro tem um dos cantos vincado e três marcas profundas na capa. Torço o nariz, mas vá, o que me interessa é o que está lá dentro e o estúpido título estava esgotado na Bertrand, o que nunca é bom sinal, e eu precisava mesmo dele. Resolvo-me a levar o livro, mesmo esteticamente estropiado, e vou à minha vida.
Quis o destino que fizesse uma paragem ainda no centro comercial e, num compasso de espera, abri o livro para dar uma vista de olhos. O primeiro scritch deixou-me logo preocupada. Mais umas páginas viradas e novo scritch...'Mau, pensei eu, este livro não chega a velho'. Abri nas páginas centrais... e claro, desconjunta-se-me tudo nas mãos. Oh joy!
Volto à loja. A miss strange olha para mim bovinamente quando eu lhe mostro o cadáver do livro, todo ele folhas e capa soltas, e lhe peço, com civilidade, porém com visível ironia, se por acaso não teria um exemplar que não se estivesse a desintegrar. Ai mas que chatice, que frete tão grande para a senhora, que teve de ligar para um tal de Gonçalo, que lhe disse que não, que não tinha. E, oh que maçada, as outras lojas já tinham fechado (às sete da tarde...) e não me conseguia confirmar se havia mais, mas de qualquer forma, 'mesmo que trocasse o livro, ia ter o mesmo problema porque a culpa era da cola usada pela editora'. E eu, já a contar de dez em dez para não lhe partir a cara, perguntei-lhe 'e então o que sugere para resolver a questão?'. Que não pode fazer nada, só trocar por outro livro, porque não devolvem o dinheiro. Explico-lhe com toda a calma que eu não quero a devolução do dinheiro, porque se fiz uma encomenda é porque preciso do livro. Daquele livro. Não de outro livro. Mas que, já agora, queria que alguém se responsabilizasse por vender um produto visivelmente defeituoso. Diz-me a tontinha que me mostrou o livro, e que eu podia ter visto antes de comprar. Não sei se mais alguém concorda comigo, mas eu sempre parti do princípio que uma livraria que se preze vende livros em bom estado e que o incauto comprador o compra de boa fé e não está a inspeccionar as costuras ou as colagens. Mas ali parece que não. Portanto, aproximei-me da mocinha e disse-lhe, com bons modos 'fazemos assim: eu levo o livro comigo, que já o paguei, e deixo uma reclamação e os senhores quando puderem tentam ver se outras lojas têm o título e trocam-me por um exemplar em condições'. A mulher ia-me comendo! 'Mas vai fazer uma reclamação porquê?????' (hello!!!!!'assim de repente, deixe cá ver...porque este livro não está em condições!?') e a moça continou 'mas vai fazer uma reclamação da livraria para um problema que é da editora????' (hello!!! Quem é que me vendeu o mono?). Olhei para ela, já bastante irritada, e disse-lhe ' Ouça (fujam se eu algum dia começar uma frase por 'ouça'), eu encomendei um livro que os senhores disseram que estava disponível para venda. Não disseram 'está disponível, mas a capa está em mau estado'. Não. Não disseram nada. Eu vi uma capa defeituosa. De onde eu venho, este livro está defeituoso. E, se eu fosse dona desta livraria nunca venderia um livro nestas condições. Contudo, estava na disposição de passar por cima do aspecto, mas o mínimo, o MÍNIMO, é que o consiga ler sem perder folhas no processo. E isso não é culpa da editora, é culpa do representante da editora perante o consumidor, que na circunstâncias são vocês. Por isso, sim, vou fazer uma reclamação!'. E fiz, quase dez minutos depois, quando a débil mental voltou com o livro, e me anunciou 'ah, entretanto falei com a gerente e excepcionalmente podemos devolver o dinheiro'. É curioso como os procedimentos mudam quando se acena com uma reclamação. Pois temos pena, que eu, excepcionalmente, até estava com tempo para preencher o papelinho. Agradeci muito à menina, e expliquei-lhe, pela terceira vez, que não estava em causa o dinheiro nem a devolução, que eu queria o livro, simplesmente queria um exemplar em condições, e como não me davam solução, era mesmo a reclamação que eu queria fazer.
Cheguei a sentir-me culpada, perante o ar chocado da moça, quase a achar que devia ser a única ave rara que alguma vez fez uma reclamação da loja. Mas foi só até ter de folhear dois terços do livro até achar uma página vaga. Agora já começo a achar que fui branda demais...
Cereja no bolo: entrego o livro, a moça destaca a folhica e devolve-me, obrigadinha e até sempre (tipo, não voltes cá que me dás muito trabalho). Eu olho para o que ela me devolveu e constato que tenho o original e a cópia. Olho para ela, e devolvo-lhe o original. Ela diz 'ah, não, nós só ficamos com o triplicado'. Eu olho para ela novamente. Ela chama o colega, porque bom, é de facto difícil ler um formulário. O colega confirma que só ficam com o triplicado. Eu digo 'oouuça: eu fico com o duplicado. Os senhores ficam com o triplicado para vocês e com o original para enviar para a inspecção das actividades económicas'. Ele diz 'não, não, a senhora é que tem de enviar'. Eu começo a ler em voz alta o que está escrito em letras garrafais no papel da reclamação: 'este original deve ser remetido pelo prestador de serviço...bla bla bla... não sei, assim de repente parece-me que os prestadores do serviço são os senhores, por isso o original é para vós! O moço capitula. 'Ah, pois é. É que aqui no livro só estão os triplicados (no shit!!!). Se calhar os originais já foram enviados, por isso é que não estão aqui'. É amigo, tu também tiraste folga no dia em que Deus distribuiu a inteligência e ficamos já por aqui...
Em suma, mal posso esperar pelo final da semana quando lá for levantar outro livro, que não estava em stock. Se eu podia anular a encomenda? Podia, mas já agora, levam comigo outra vez!

3 comentários:

  1. Não é excepcionalmente. Produto defeituoso dá direito a restituição do dinheirinho, ponto final. Já tive que explicar isto vezes de mais. Os comerciantes portugueses ou são mal informados ou andam de má fé. E não, não se vende um livro nesse estado, por alguma razão há feiras de livros manuseados, com descontos apreciáveis. Apre!

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  2. Eheheh, essa parece a história da Jonas e do telemóvel defeituoso. Que a empresa inclusivamente queria pôr em tribunal, para a obrigar a apagar o que tinha escrito no blogue dela sobre o maus serviço e atendimento deles. Era a grande empresa por um lado e a Jonas por outro, assim contavam eles. Mal! Porque a história circulou nos blogues e no FB e ao fim de dois ou três dias de braço de ferro, quando já recebiam cerca de 200 comentários por dia a insultá-los (de toda a maneira e feitio), acabaram por retirar a queixa com um pedido de desculpas - tirado a ferros, é certo, mas aquilo estava a ser um verdadeiro tiroteio nos próprios pés...

    Curiosamente, suponho que a história também se passou no mesmo centro comercial. Coincidência? :)))

    Beijocas!

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